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quarta-feira, maio 28, 2014

Não tem a menor Importância estarem Sofrendo - Cachorros.


Não tem a menor Importância estarem Sofrendo - Cachorros:  Para a teologia católica, fundada como ela é na escolástica, os animais não têm estatura moral. Se temos alguns deveres em relação a eles, são deveres indiretos, devido a certos interesses humanos envolvidos. Animais não são racionais como os seres humanos, e, portanto, não podem ter almas imortais. Mesmo a escolástica mais fervorosa admite hoje, provavelmente, que os animais sentem alguma dor, mas, se a sentem, sua dor não é vista como moralmente relevante ou verdadeiramente análoga à dor humana. Consequentemente, animais não têm direitos. “Zoófilos freqüentemente perdem de vista a finalidade para a qual os animais, criaturas irracionais, foram criados por Deus, isto é, para servir e serem usados pelo homem”, afirma o Dicionário de Teologia Moral. “De fato, a doutrina moral católica ensina que os animais não têm direitos, da parte do homem.”

É nesse contexto que devemos compreender a presente discussão, ao mesmo tempo filosófica e teológica, sobre direitos animais. É a persistência do catolicismo escolástico que inevitavelmente faz dos direitos a questão que ela é. Quando se considera a riqueza do aprendizado e das prescrições em relação aos animais no âmbito da tradição cristã, é certamente desconcertante que essas influências negativas continuem a ser sustentadas e continuem a manter-se em destaque. A questão dos direitos animais não é uma concessão ao pensamento secular no âmbito dos círculos teológicos, mas simplesmente o último estágio de um debate que iniciou há uma centena de anos. John Foster, escrevendo em 1856 (contra a oposição de William Wyndham ao estabelecimento da primeira legislação do bem-estar animal), queixa-se de termos sido ensinados, “desde nossa mais tenra infância, que as sensações prazerosas e dolorosas dos animais não são dignas de atenção; que não tem a menor importância estarem sofrendo, desde que não se tornem menos prestativos por causa de seu sofrimento… que, em resumo, eles não têm direitos enquanto seres sencientes que existem para seu próprio bem, tanto quanto para o nosso.” Se hoje as pessoas preferem o termo “direitos animais” em vez de “amor pelos animais” ou “bem-estar animal”, elas estão, consciente ou inconscientemente, vinculando-se a um debate histórico que de modo algum está encerrado. Não é irrelevante o fato de que a “Sociedade Católica do Bem-estar Animal” nos Estados Unidos tornou-se agora a “Sociedade Internacional pelos Direitos Animais.”…

O argumento de que os cristãos devem continuar a empregar a linguagem dos direitos e estender seu uso aos animais precisa ser submetido a três críticas. A primeira é que os cristãos não devem exigir que a teoria dos direitos seja a única teoria da obrigação moral. À objeção de que a teoria dos direitos pode ser de certo modo deficiente ou inadequada, devemos replicar que possivelmente nenhuma teoria pode fazer justiça a todos os temas e ensinamentos da tradição cristã. Se isso soa como algo aquém de uma defesa enfática dos direitos, então, é preciso considerar se qualquer teoria moral, seja a da ordem divina ou a do dever humano, pode reivindicar ser a única possível, de uma perspectiva teológica. O que estamos a caracterizar na teoria moral cristã é nada menos do que a vontade de Deus. A vontade divina é indubitavelmente complexa, até mesmo sutil e possivelmente em desenvolvimento. Quando optamos pela linguagem dos direitos divinos, o fazemos com a reserva e cautela devidas, não porque essa teoria seja necessariamente mais difícil do que outra, mas porque toda teoria moral é teologicamente problemática. Quando seguimos de uma identificação direta da vontade de Deus com seu imperativo particular numa dada situação, para o trabalho de caracterização, isto é, para caracterizar e sistematizar a vontade de Deus em termos gerais, então somos confrontados com a ameaça contínua de uma simplificação exagerada. É claro que a vontade de Deus pode ser simples, mas ela também pode ser notavelmente misteriosa. Mesmo Karl Barth, um forte defensor dos mandamentos divinos, concede que não é uma tarefa fácil para a ética cristã dizer-nos qual é a vontade de Deus. Por nosso intelecto e linguagem, estamos sempre, através da caracterização, aproximando a vontade divina de sua criação. Embora os direitos divinos possam ser o melhor meio para caracterizar o imperativo divino, disso não se conclui que devemos afirmar que tal teoria seja de qualquer modo adequada ou que [in God’s good time] certa forma nova de caracterização teo-moral não a possa aprimorar. Sem dúvida, nossa própria reflexão moral, seja lá quão inspirada for, é, do mesmo modo que o resto da vida criada o é, carente de redenção.

A segunda crítica é que a linguagem dos direitos não pode reivindicar ser abrangente. Isso quer dizer que não pode excluir outras formas de linguagem e conhecimento moral. Falar de generosidade, respeito, dever, sacrifício e compaixão é tão essencial quanto falar de direitos. Pode ser que os animalistas legalistas tenham enfatizado tanto a importância do conceito de direitos que acabaram por negligenciar a fala sobre a compaixão e o respeito. Pode ser, mas, para os cristãos, espero que possamos considerar garantida essa linguagem… Uma função da linguagem dos direitos é fornecer parâmetros e critérios na caminhada para viver de um modo menos explorador com outras criaturas. Essa é certamente uma função valiosa, mas por si mesma não garante uma interpretação positiva total e suficiente do imperativo divino. Em outras palavras, a ética cristã não se destina simplesmente a evitar o pior, mas a promover o bem. Para a elaboração, definição e busca do bem com os animais, precisamos de mais termos do que os pode fornecer a linguagem dos direitos. Pode ocorrer em certas situações que devamos conceder aos animais mais do que a teoria dos direitos lhes concede estritamente, e erremos, por generosidade. Pois, generosidade é certamente uma noção importante e a linguagem dos direitos deve estar atenta para não limitá-la, mesmo se não pudermos nos convencer de que ela tem o estatuto do “dever”. Para aqueles que pensam simplesmente que não deveríamos respeitar os direitos de, digamos, pardais, mas de fato buscam relações de amor e cuidado para com eles, a concepção dos direitos não lhes oferece obstáculo. Para aqueles que se sentem chamados a atos heróicos especiais de auto-sacrifício em favor de certas espécies animais, a concepção de direitos, outra vez, não oferece qualquer objeção. Sempre haverá pessoas inspiradas na vida de Jesus e dos muitos santos, que se sentem motivadas para atos heróicos e sacrificados. Mas, é claro, normalmente não é a essas pessoas que a linguagem dos direitos é dirigida. Resumindo: ao lutar pelo bem positivo de animais e humanos, os cristãos terão necessidade de usar um vocabulário diversificado. Tudo o que se exige aqui é que a linguagem dos direitos deve fazer parte da armadura.

Terceira, é preciso reiterar que os direitos dos quais falamos são só e propriamente os direitos de Deus. Somente sua vontade quer a dádiva da vida que os torna possíveis; somente ele encarrega o homem da proteção deles; e somente ele, ao fim das contas, pode garanti-los propriamente. Uma conclusão pode ser tirada disso: do mesmo modo em que nosso conhecimento de Deus avança com o poder do espírito, também pode avançar nosso conhecimento de sua vontade e, portanto, nosso entendimento de seus direitos. Alguns teólogos consideram a terminologia dos direitos um modo extremamente estático de descrever a relação de Deus com aquilo que, na verdade, é uma criação dinâmica e aberta. Mas os direitos divinos não são necessariamente tão estáticos quanto o são sua contrapartida secular. A possibilidade de mudança é inerente pelo fato de que nossa compreensão de Deus se desenvolve, seja para melhor ou para pior. Pode ser que o espírito divino nos mova para uma nova compreensão de nosso lugar no universo de tal modo que torne as controvérsias anteriores sobre a salvação individual do tempo da Reforma parecerem triviais, quando comparadas. Pode ser e pode não ser. Em qualquer dos casos, é nossa responsabilidade reconhecer os direitos de Deus na criação e defendê-los…

A questão pode não ser colocada de forma irrazoável: Qual é, então, a vantagem abrangente da teoria dos direitos, que a justifica, apesar dessas críticas? A resposta pode ser óbvia. A linguagem dos direitos insiste em que concebamos as exigências dos animais em termos análogos aos de outros seres, os humanos. Esse é o porquê de [alguns, talvez muitos] hesitarem ou rejeitarem os direitos animais: eles negam que as exigências de seres dotados de outros tipos de alma possam ser em qualquer sentido semelhantes às humanas. Na questão dos direitos animais, talvez mais do que em outras, os cristãos se confrontam com a limitação de sua própria história escolástica. A escolástica considerou por séculos os animais como “coisas”. O resultado não surpreende: os animais foram tratados como coisas. Em toda sofisticação intelectual dos argumentos contrários aos direitos animais, uma consideração claramente prática predomina. Aceitar que os animais têm direitos implica em ter de aceitar que eles deveriam ser tratados de modo diferente do modo como a maioria deles é tratada até hoje. Reconhecer explicitamente que os animais têm direitos implica em aceitar que eles têm uma estatura moral fundamental. Caso eles não tenham tal estatura, eles não podem pôr exigências; e se eles não têm exigências, eles não podem ter direitos. Talvez à luz de sua tradição seja fácil para os cristãos ver a significância histórica do debate sobre direitos mais do que o é aos seus contemporâneos leigos. Aqueles que negam direitos aos não-humanos argumentam com a história do que significa o não-direito para os animais; se o argumento oposto não os convence, isso se deve invariavelmente ao fato de que eles não querem aceitar que a maioria dos animais é tratada injustamente.

Isso é o que os irrita. Garantir direitos aos animais é aceitar que podem estar errados. De acordo com os direitos divinos, o que fazemos aos animais não é uma questão de gosto, conveniência ou filantropia. Quando falamos de direitos animais concebemos o que objetivamente devemos aos animais por uma questão de justiça, em função dos direitos que lhes foram concedidos por seu Criador. Animais podem ser prejudicados, porque seu Criador pode ser prejudicado em sua obra. Alguns filósofos ainda insistem em afirmar que é possível oferecer uma concepção teórica para melhorar o tratamento dos animais sem recorrer à noção de direitos. Pode ser possível oferecer algo melhor por essa via, mas muito permanece historicamente em aberto. Talvez possa ser possível através de um cálculo utilitarista evitar alguns dos males possíveis que ocorrem aos animais, mas com isso seu estatuto será alterado fundamentalmente? A linguagem e a história são contrárias àqueles que querem um melhor tratamento para os animais e também querem negar a legitimidade da linguagem dos direitos. Pois, de que modo podemos reverter séculos de tradição escolástica, se ainda aceitamos a pedra fundamental dessa tradição, qual seja, que todos, exceto os humanos, são destituídos de direitos? Se o que foi dito parece invocar a necessidade dubiosa de penitência na formulação da teoria ética, só se pode replicar que arrependimento é um dever cardinal para os cristãos. Se o cálculo das conseqüências permite dizer algo nas afirmações morais, então devemos aceitar que os cristãos têm boas razões para olhar o que sua própria teologia criou, e, à luz disso, teologizar tudo de novo, a partir do zero.

Mas, independentemente dessa necessidade prática de reverter séculos de descaso, os direitos divinos fazem sentido para um amplo espectro de conhecimentos teológicos – três em especial. O primeiro, o da absoluta dádiva da realidade criada. A menos que Deus seja indiferente para com a criação, aqueles seres cuja vida é inspirada por seu espírito têm valor especial e portanto requerem proteção especial. O segundo, a necessidade de testemunhar o poder eleitor de Deus em sua relação contratual. Homens e animais formam uma comunidade moral, não apenas por causa de sua origem comum, mas porque Deus os elegeu para uma relação especial com ele. A escolástica católica negou a possibilidade de uma comunidade moral com os brutos. “Nada irracional pode ser objeto da virtude cristã do amor ao próximo, da caridade”, escreve Bernard Häring. “Nada irracional”, ele nos diz, “é capaz de uma relação embelezadora com Deus.” O que a escolástica aqui nega e disputa, os direitos divinos assumem. Por serem homens e animais eleitos por Deus, formamos perante ele uma comunidade contratual de seres dotados de espírito. Terceiro, a perspectiva dos direitos divinos dá sentido à longa tradição que busca identificar o poder divino do homem na criação. De acordo com os direitos divinos, os humanos devem exercer o poder, mas apenas para a finalidade divina. A única significância do homem, nesse sentido, consiste em sua capacidade para perceber a vontade de Deus e para realizá-la em sua própria vida. O homem deve “comprometer-se com a tarefa divina”, afirma Edward Carpenter, de “elevar a criação, redimir a ordem da qual faz parte, e dirigi-la para seu fim.”

Aqueles que negam direitos divinos para os animais precisam mostrar de que modo podem concretizar efetivamente esses ensinamentos sem tomar parte no descaso dos não-humanos que ainda caracteriza elementos permanentes no âmbito da tradição cristã.

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Para Servir e Serem usados pelo Homem - Cachorros.


Para Servir e Serem Usados pelo Homem - Cachorros:  Para a teologia católica, fundada como ela é na escolástica, os animais não têm estatura moral. Se temos alguns deveres em relação a eles, são deveres indiretos, devido a certos interesses humanos envolvidos. Animais não são racionais como os seres humanos, e, portanto, não podem ter almas imortais. Mesmo a escolástica mais fervorosa admite hoje, provavelmente, que os animais sentem alguma dor, mas, se a sentem, sua dor não é vista como moralmente relevante ou verdadeiramente análoga à dor humana. Consequentemente, animais não têm direitos. “Zoófilos freqüentemente perdem de vista a finalidade para a qual os animais, criaturas irracionais, foram criados por Deus, isto é, para servir e serem usados pelo homem”, afirma o Dicionário de Teologia Moral. “De fato, a doutrina moral católica ensina que os animais não têm direitos, da parte do homem.”

É nesse contexto que devemos compreender a presente discussão, ao mesmo tempo filosófica e teológica, sobre direitos animais. É a persistência do catolicismo escolástico que inevitavelmente faz dos direitos a questão que ela é. Quando se considera a riqueza do aprendizado e das prescrições em relação aos animais no âmbito da tradição cristã, é certamente desconcertante que essas influências negativas continuem a ser sustentadas e continuem a manter-se em destaque. A questão dos direitos animais não é uma concessão ao pensamento secular no âmbito dos círculos teológicos, mas simplesmente o último estágio de um debate que iniciou há uma centena de anos. John Foster, escrevendo em 1856 (contra a oposição de William Wyndham ao estabelecimento da primeira legislação do bem-estar animal), queixa-se de termos sido ensinados, “desde nossa mais tenra infância, que as sensações prazerosas e dolorosas dos animais não são dignas de atenção; que não tem a menor importância estarem sofrendo, desde que não se tornem menos prestativos por causa de seu sofrimento… que, em resumo, eles não têm direitos enquanto seres sencientes que existem para seu próprio bem, tanto quanto para o nosso.” Se hoje as pessoas preferem o termo “direitos animais” em vez de “amor pelos animais” ou “bem-estar animal”, elas estão, consciente ou inconscientemente, vinculando-se a um debate histórico que de modo algum está encerrado. Não é irrelevante o fato de que a “Sociedade Católica do Bem-estar Animal” nos Estados Unidos tornou-se agora a “Sociedade Internacional pelos Direitos Animais.”…

O argumento de que os cristãos devem continuar a empregar a linguagem dos direitos e estender seu uso aos animais precisa ser submetido a três críticas. A primeira é que os cristãos não devem exigir que a teoria dos direitos seja a única teoria da obrigação moral. À objeção de que a teoria dos direitos pode ser de certo modo deficiente ou inadequada, devemos replicar que possivelmente nenhuma teoria pode fazer justiça a todos os temas e ensinamentos da tradição cristã. Se isso soa como algo aquém de uma defesa enfática dos direitos, então, é preciso considerar se qualquer teoria moral, seja a da ordem divina ou a do dever humano, pode reivindicar ser a única possível, de uma perspectiva teológica. O que estamos a caracterizar na teoria moral cristã é nada menos do que a vontade de Deus. A vontade divina é indubitavelmente complexa, até mesmo sutil e possivelmente em desenvolvimento. Quando optamos pela linguagem dos direitos divinos, o fazemos com a reserva e cautela devidas, não porque essa teoria seja necessariamente mais difícil do que outra, mas porque toda teoria moral é teologicamente problemática. Quando seguimos de uma identificação direta da vontade de Deus com seu imperativo particular numa dada situação, para o trabalho de caracterização, isto é, para caracterizar e sistematizar a vontade de Deus em termos gerais, então somos confrontados com a ameaça contínua de uma simplificação exagerada. É claro que a vontade de Deus pode ser simples, mas ela também pode ser notavelmente misteriosa. Mesmo Karl Barth, um forte defensor dos mandamentos divinos, concede que não é uma tarefa fácil para a ética cristã dizer-nos qual é a vontade de Deus. Por nosso intelecto e linguagem, estamos sempre, através da caracterização, aproximando a vontade divina de sua criação. Embora os direitos divinos possam ser o melhor meio para caracterizar o imperativo divino, disso não se conclui que devemos afirmar que tal teoria seja de qualquer modo adequada ou que [in God’s good time] certa forma nova de caracterização teo-moral não a possa aprimorar. Sem dúvida, nossa própria reflexão moral, seja lá quão inspirada for, é, do mesmo modo que o resto da vida criada o é, carente de redenção.

A segunda crítica é que a linguagem dos direitos não pode reivindicar ser abrangente. Isso quer dizer que não pode excluir outras formas de linguagem e conhecimento moral. Falar de generosidade, respeito, dever, sacrifício e compaixão é tão essencial quanto falar de direitos. Pode ser que os animalistas legalistas tenham enfatizado tanto a importância do conceito de direitos que acabaram por negligenciar a fala sobre a compaixão e o respeito. Pode ser, mas, para os cristãos, espero que possamos considerar garantida essa linguagem… Uma função da linguagem dos direitos é fornecer parâmetros e critérios na caminhada para viver de um modo menos explorador com outras criaturas. Essa é certamente uma função valiosa, mas por si mesma não garante uma interpretação positiva total e suficiente do imperativo divino. Em outras palavras, a ética cristã não se destina simplesmente a evitar o pior, mas a promover o bem. Para a elaboração, definição e busca do bem com os animais, precisamos de mais termos do que os pode fornecer a linguagem dos direitos. Pode ocorrer em certas situações que devamos conceder aos animais mais do que a teoria dos direitos lhes concede estritamente, e erremos, por generosidade. Pois, generosidade é certamente uma noção importante e a linguagem dos direitos deve estar atenta para não limitá-la, mesmo se não pudermos nos convencer de que ela tem o estatuto do “dever”. Para aqueles que pensam simplesmente que não deveríamos respeitar os direitos de, digamos, pardais, mas de fato buscam relações de amor e cuidado para com eles, a concepção dos direitos não lhes oferece obstáculo. Para aqueles que se sentem chamados a atos heróicos especiais de auto-sacrifício em favor de certas espécies animais, a concepção de direitos, outra vez, não oferece qualquer objeção. Sempre haverá pessoas inspiradas na vida de Jesus e dos muitos santos, que se sentem motivadas para atos heróicos e sacrificados. Mas, é claro, normalmente não é a essas pessoas que a linguagem dos direitos é dirigida. Resumindo: ao lutar pelo bem positivo de animais e humanos, os cristãos terão necessidade de usar um vocabulário diversificado. Tudo o que se exige aqui é que a linguagem dos direitos deve fazer parte da armadura.

Terceira, é preciso reiterar que os direitos dos quais falamos são só e propriamente os direitos de Deus. Somente sua vontade quer a dádiva da vida que os torna possíveis; somente ele encarrega o homem da proteção deles; e somente ele, ao fim das contas, pode garanti-los propriamente. Uma conclusão pode ser tirada disso: do mesmo modo em que nosso conhecimento de Deus avança com o poder do espírito, também pode avançar nosso conhecimento de sua vontade e, portanto, nosso entendimento de seus direitos. Alguns teólogos consideram a terminologia dos direitos um modo extremamente estático de descrever a relação de Deus com aquilo que, na verdade, é uma criação dinâmica e aberta. Mas os direitos divinos não são necessariamente tão estáticos quanto o são sua contrapartida secular. A possibilidade de mudança é inerente pelo fato de que nossa compreensão de Deus se desenvolve, seja para melhor ou para pior. Pode ser que o espírito divino nos mova para uma nova compreensão de nosso lugar no universo de tal modo que torne as controvérsias anteriores sobre a salvação individual do tempo da Reforma parecerem triviais, quando comparadas. Pode ser e pode não ser. Em qualquer dos casos, é nossa responsabilidade reconhecer os direitos de Deus na criação e defendê-los…

A questão pode não ser colocada de forma irrazoável: Qual é, então, a vantagem abrangente da teoria dos direitos, que a justifica, apesar dessas críticas? A resposta pode ser óbvia. A linguagem dos direitos insiste em que concebamos as exigências dos animais em termos análogos aos de outros seres, os humanos. Esse é o porquê de [alguns, talvez muitos] hesitarem ou rejeitarem os direitos animais: eles negam que as exigências de seres dotados de outros tipos de alma possam ser em qualquer sentido semelhantes às humanas. Na questão dos direitos animais, talvez mais do que em outras, os cristãos se confrontam com a limitação de sua própria história escolástica. A escolástica considerou por séculos os animais como “coisas”. O resultado não surpreende: os animais foram tratados como coisas. Em toda sofisticação intelectual dos argumentos contrários aos direitos animais, uma consideração claramente prática predomina. Aceitar que os animais têm direitos implica em ter de aceitar que eles deveriam ser tratados de modo diferente do modo como a maioria deles é tratada até hoje. Reconhecer explicitamente que os animais têm direitos implica em aceitar que eles têm uma estatura moral fundamental. Caso eles não tenham tal estatura, eles não podem pôr exigências; e se eles não têm exigências, eles não podem ter direitos. Talvez à luz de sua tradição seja fácil para os cristãos ver a significância histórica do debate sobre direitos mais do que o é aos seus contemporâneos leigos. Aqueles que negam direitos aos não-humanos argumentam com a história do que significa o não-direito para os animais; se o argumento oposto não os convence, isso se deve invariavelmente ao fato de que eles não querem aceitar que a maioria dos animais é tratada injustamente.

Isso é o que os irrita. Garantir direitos aos animais é aceitar que podem estar errados. De acordo com os direitos divinos, o que fazemos aos animais não é uma questão de gosto, conveniência ou filantropia. Quando falamos de direitos animais concebemos o que objetivamente devemos aos animais por uma questão de justiça, em função dos direitos que lhes foram concedidos por seu Criador. Animais podem ser prejudicados, porque seu Criador pode ser prejudicado em sua obra. Alguns filósofos ainda insistem em afirmar que é possível oferecer uma concepção teórica para melhorar o tratamento dos animais sem recorrer à noção de direitos. Pode ser possível oferecer algo melhor por essa via, mas muito permanece historicamente em aberto. Talvez possa ser possível através de um cálculo utilitarista evitar alguns dos males possíveis que ocorrem aos animais, mas com isso seu estatuto será alterado fundamentalmente? A linguagem e a história são contrárias àqueles que querem um melhor tratamento para os animais e também querem negar a legitimidade da linguagem dos direitos. Pois, de que modo podemos reverter séculos de tradição escolástica, se ainda aceitamos a pedra fundamental dessa tradição, qual seja, que todos, exceto os humanos, são destituídos de direitos? Se o que foi dito parece invocar a necessidade dubiosa de penitência na formulação da teoria ética, só se pode replicar que arrependimento é um dever cardinal para os cristãos. Se o cálculo das conseqüências permite dizer algo nas afirmações morais, então devemos aceitar que os cristãos têm boas razões para olhar o que sua própria teologia criou, e, à luz disso, teologizar tudo de novo, a partir do zero.

Mas, independentemente dessa necessidade prática de reverter séculos de descaso, os direitos divinos fazem sentido para um amplo espectro de conhecimentos teológicos – três em especial. O primeiro, o da absoluta dádiva da realidade criada. A menos que Deus seja indiferente para com a criação, aqueles seres cuja vida é inspirada por seu espírito têm valor especial e portanto requerem proteção especial. O segundo, a necessidade de testemunhar o poder eleitor de Deus em sua relação contratual. Homens e animais formam uma comunidade moral, não apenas por causa de sua origem comum, mas porque Deus os elegeu para uma relação especial com ele. A escolástica católica negou a possibilidade de uma comunidade moral com os brutos. “Nada irracional pode ser objeto da virtude cristã do amor ao próximo, da caridade”, escreve Bernard Häring. “Nada irracional”, ele nos diz, “é capaz de uma relação embelezadora com Deus.” O que a escolástica aqui nega e disputa, os direitos divinos assumem. Por serem homens e animais eleitos por Deus, formamos perante ele uma comunidade contratual de seres dotados de espírito. Terceiro, a perspectiva dos direitos divinos dá sentido à longa tradição que busca identificar o poder divino do homem na criação. De acordo com os direitos divinos, os humanos devem exercer o poder, mas apenas para a finalidade divina. A única significância do homem, nesse sentido, consiste em sua capacidade para perceber a vontade de Deus e para realizá-la em sua própria vida. O homem deve “comprometer-se com a tarefa divina”, afirma Edward Carpenter, de “elevar a criação, redimir a ordem da qual faz parte, e dirigi-la para seu fim.”

Aqueles que negam direitos divinos para os animais precisam mostrar de que modo podem concretizar efetivamente esses ensinamentos sem tomar parte no descaso dos não-humanos que ainda caracteriza elementos permanentes no âmbito da tradição cristã.

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terça-feira, maio 27, 2014

"Sinto-me como um Peixe fora D'água" - Cachorros.


"Sinto-me como um Peixe fora D'água" - Cachorros:  “PROCURAM-SE esses jovens que maltrataram um filhote e tiraram fotos” era a referência na linha de assunto do e-mail que eu recebi de amigos. O texto, pedindo que todos repassassem com urgência para que alguém reconhecesse os personagens da foto e os denunciassem, trazia palavras impublicáveis de xingamento aos dois rapazes que apareciam segurando um cachorro pendurado pelo pescoço por uma espécie de barbante, como se estivesse enforcado. Revolta justa.

No mesmo instante tive a impressão de já ter visto aquela cena em algum lugar e me lembrei das inúmeras fotos que vi de pescadores segurando com orgulho, pendurados, seus peixes como o prêmio merecido pela dedicação ao seu esporte. “Será que ninguém percebe que o coitadinho do peixe, além de tudo, não pode respirar fora da água?”, pensei, sem conseguir tirar os olhos da foto.

A maior parte dos peixes pescados morre sufocada – e se debatendo em desespero, lutando contra a dor e para respirar. Aos que ainda acreditam que peixe não sente dor e por isso com eles podemos fazer de tudo, existem diversos materiais disponíveis demonstrando o contrário. Só para citar um deles, um resultado de pesquisa publicado em 2003 por cientistas britânicos apontava a primeira evidência conclusiva da dor que os peixes sentem, tendo encontrado áreas na cabeça das trutas que responderam a estímulos destrutivos, além de reações a substâncias nocivas. O estudo foi feito por uma equipe do Instituto Roslin, em parceria com a Universidade de Edimburgo e publicado na revista científica Proceedings da Royal Society (academia britânica de ciência).

Meu questionamento diante do e-mail era: se os peixes sentem dor, morrem asfixiados, não seria justo enviar e-mail com fotos dos pescadores assim como estava sendo feito com aqueles rapazes para que fossem encontrados e também pagassem pela crueldade com inocentes animais?

Quero deixar claro que acho justa a revolta e indignação diante da atitude dos garotos. Acontece que não entendo não surgir a mesma revolta diante de cenas semelhantes, somente porque pescar foi inserido em nossa cultura como uma coisa bacana, legal, sem maiores conseqüências. O personagem principal é o mesmo, o pescador, seja de peixes ou cachorros.

Não é à toa que quando estamos em uma situação difícil, incômoda, dolorosa, em um lugar do qual queremos sair correndo para nunca mais voltar, dizemos: “sinto-me como um peixe fora d´água”. Não deve ser fácil morrer sufocado.

Sugiro a quem receber o tal e-mail com a foto experimentar fazer uma substituição mental colocando, no lugar do cachorro, a figura de um peixe. Se achamos que um não pode sofrer, mas o outro pode, talvez esteja na hora de revermos nossos valores…

“Enquanto via o peixe lutando para respirar, percebi que a vida dele é tão importante para ele quanto a minha vida é importante para mim” – Paul McCartney, que virou vegetariano depois de uma pescaria.

Acreditam que Peixe não Sente Dor - Cachorros.


Acreditam que Peixe não Sente Dor - Cachorros:  “PROCURAM-SE esses jovens que maltrataram um filhote e tiraram fotos” era a referência na linha de assunto do e-mail que eu recebi de amigos. O texto, pedindo que todos repassassem com urgência para que alguém reconhecesse os personagens da foto e os denunciassem, trazia palavras impublicáveis de xingamento aos dois rapazes que apareciam segurando um cachorro pendurado pelo pescoço por uma espécie de barbante, como se estivesse enforcado. Revolta justa.

No mesmo instante tive a impressão de já ter visto aquela cena em algum lugar e me lembrei das inúmeras fotos que vi de pescadores segurando com orgulho, pendurados, seus peixes como o prêmio merecido pela dedicação ao seu esporte. “Será que ninguém percebe que o coitadinho do peixe, além de tudo, não pode respirar fora da água?”, pensei, sem conseguir tirar os olhos da foto.

A maior parte dos peixes pescados morre sufocada – e se debatendo em desespero, lutando contra a dor e para respirar. Aos que ainda acreditam que peixe não sente dor e por isso com eles podemos fazer de tudo, existem diversos materiais disponíveis demonstrando o contrário. Só para citar um deles, um resultado de pesquisa publicado em 2003 por cientistas britânicos apontava a primeira evidência conclusiva da dor que os peixes sentem, tendo encontrado áreas na cabeça das trutas que responderam a estímulos destrutivos, além de reações a substâncias nocivas. O estudo foi feito por uma equipe do Instituto Roslin, em parceria com a Universidade de Edimburgo e publicado na revista científica Proceedings da Royal Society (academia britânica de ciência).

Meu questionamento diante do e-mail era: se os peixes sentem dor, morrem asfixiados, não seria justo enviar e-mail com fotos dos pescadores assim como estava sendo feito com aqueles rapazes para que fossem encontrados e também pagassem pela crueldade com inocentes animais?

Quero deixar claro que acho justa a revolta e indignação diante da atitude dos garotos. Acontece que não entendo não surgir a mesma revolta diante de cenas semelhantes, somente porque pescar foi inserido em nossa cultura como uma coisa bacana, legal, sem maiores conseqüências. O personagem principal é o mesmo, o pescador, seja de peixes ou cachorros.

Não é à toa que quando estamos em uma situação difícil, incômoda, dolorosa, em um lugar do qual queremos sair correndo para nunca mais voltar, dizemos: “sinto-me como um peixe fora d´água”. Não deve ser fácil morrer sufocado.

Sugiro a quem receber o tal e-mail com a foto experimentar fazer uma substituição mental colocando, no lugar do cachorro, a figura de um peixe. Se achamos que um não pode sofrer, mas o outro pode, talvez esteja na hora de revermos nossos valores…

“Enquanto via o peixe lutando para respirar, percebi que a vida dele é tão importante para ele quanto a minha vida é importante para mim” – Paul McCartney, que virou vegetariano depois de uma pescaria.

Lutando Contra a Dor e para Respirar - Cachorros.


Lutando Contra a Dor e para Respirar - Cachorros:  “PROCURAM-SE esses jovens que maltrataram um filhote e tiraram fotos” era a referência na linha de assunto do e-mail que eu recebi de amigos. O texto, pedindo que todos repassassem com urgência para que alguém reconhecesse os personagens da foto e os denunciassem, trazia palavras impublicáveis de xingamento aos dois rapazes que apareciam segurando um cachorro pendurado pelo pescoço por uma espécie de barbante, como se estivesse enforcado. Revolta justa.

No mesmo instante tive a impressão de já ter visto aquela cena em algum lugar e me lembrei das inúmeras fotos que vi de pescadores segurando com orgulho, pendurados, seus peixes como o prêmio merecido pela dedicação ao seu esporte. “Será que ninguém percebe que o coitadinho do peixe, além de tudo, não pode respirar fora da água?”, pensei, sem conseguir tirar os olhos da foto.

A maior parte dos peixes pescados morre sufocada – e se debatendo em desespero, lutando contra a dor e para respirar. Aos que ainda acreditam que peixe não sente dor e por isso com eles podemos fazer de tudo, existem diversos materiais disponíveis demonstrando o contrário. Só para citar um deles, um resultado de pesquisa publicado em 2003 por cientistas britânicos apontava a primeira evidência conclusiva da dor que os peixes sentem, tendo encontrado áreas na cabeça das trutas que responderam a estímulos destrutivos, além de reações a substâncias nocivas. O estudo foi feito por uma equipe do Instituto Roslin, em parceria com a Universidade de Edimburgo e publicado na revista científica Proceedings da Royal Society (academia britânica de ciência).

Meu questionamento diante do e-mail era: se os peixes sentem dor, morrem asfixiados, não seria justo enviar e-mail com fotos dos pescadores assim como estava sendo feito com aqueles rapazes para que fossem encontrados e também pagassem pela crueldade com inocentes animais?

Quero deixar claro que acho justa a revolta e indignação diante da atitude dos garotos. Acontece que não entendo não surgir a mesma revolta diante de cenas semelhantes, somente porque pescar foi inserido em nossa cultura como uma coisa bacana, legal, sem maiores conseqüências. O personagem principal é o mesmo, o pescador, seja de peixes ou cachorros.

Não é à toa que quando estamos em uma situação difícil, incômoda, dolorosa, em um lugar do qual queremos sair correndo para nunca mais voltar, dizemos: “sinto-me como um peixe fora d´água”. Não deve ser fácil morrer sufocado.

Sugiro a quem receber o tal e-mail com a foto experimentar fazer uma substituição mental colocando, no lugar do cachorro, a figura de um peixe. Se achamos que um não pode sofrer, mas o outro pode, talvez esteja na hora de revermos nossos valores…

“Enquanto via o peixe lutando para respirar, percebi que a vida dele é tão importante para ele quanto a minha vida é importante para mim” – Paul McCartney, que virou vegetariano depois de uma pescaria.

Se Debatendo em Desespero - Cachorros.


Se Debatendo em Desespero - Cachorros:  “PROCURAM-SE esses jovens que maltrataram um filhote e tiraram fotos” era a referência na linha de assunto do e-mail que eu recebi de amigos. O texto, pedindo que todos repassassem com urgência para que alguém reconhecesse os personagens da foto e os denunciassem, trazia palavras impublicáveis de xingamento aos dois rapazes que apareciam segurando um cachorro pendurado pelo pescoço por uma espécie de barbante, como se estivesse enforcado. Revolta justa.

No mesmo instante tive a impressão de já ter visto aquela cena em algum lugar e me lembrei das inúmeras fotos que vi de pescadores segurando com orgulho, pendurados, seus peixes como o prêmio merecido pela dedicação ao seu esporte. “Será que ninguém percebe que o coitadinho do peixe, além de tudo, não pode respirar fora da água?”, pensei, sem conseguir tirar os olhos da foto.

A maior parte dos peixes pescados morre sufocada – e se debatendo em desespero, lutando contra a dor e para respirar. Aos que ainda acreditam que peixe não sente dor e por isso com eles podemos fazer de tudo, existem diversos materiais disponíveis demonstrando o contrário. Só para citar um deles, um resultado de pesquisa publicado em 2003 por cientistas britânicos apontava a primeira evidência conclusiva da dor que os peixes sentem, tendo encontrado áreas na cabeça das trutas que responderam a estímulos destrutivos, além de reações a substâncias nocivas. O estudo foi feito por uma equipe do Instituto Roslin, em parceria com a Universidade de Edimburgo e publicado na revista científica Proceedings da Royal Society (academia britânica de ciência).

Meu questionamento diante do e-mail era: se os peixes sentem dor, morrem asfixiados, não seria justo enviar e-mail com fotos dos pescadores assim como estava sendo feito com aqueles rapazes para que fossem encontrados e também pagassem pela crueldade com inocentes animais?

Quero deixar claro que acho justa a revolta e indignação diante da atitude dos garotos. Acontece que não entendo não surgir a mesma revolta diante de cenas semelhantes, somente porque pescar foi inserido em nossa cultura como uma coisa bacana, legal, sem maiores conseqüências. O personagem principal é o mesmo, o pescador, seja de peixes ou cachorros.

Não é à toa que quando estamos em uma situação difícil, incômoda, dolorosa, em um lugar do qual queremos sair correndo para nunca mais voltar, dizemos: “sinto-me como um peixe fora d´água”. Não deve ser fácil morrer sufocado.

Sugiro a quem receber o tal e-mail com a foto experimentar fazer uma substituição mental colocando, no lugar do cachorro, a figura de um peixe. Se achamos que um não pode sofrer, mas o outro pode, talvez esteja na hora de revermos nossos valores…

“Enquanto via o peixe lutando para respirar, percebi que a vida dele é tão importante para ele quanto a minha vida é importante para mim” – Paul McCartney, que virou vegetariano depois de uma pescaria.

Revolta e Indignação - Cachorros.


Revolta e Indignação - Cachorros:  “PROCURAM-SE esses jovens que maltrataram um filhote e tiraram fotos” era a referência na linha de assunto do e-mail que eu recebi de amigos. O texto, pedindo que todos repassassem com urgência para que alguém reconhecesse os personagens da foto e os denunciassem, trazia palavras impublicáveis de xingamento aos dois rapazes que apareciam segurando um cachorro pendurado pelo pescoço por uma espécie de barbante, como se estivesse enforcado. Revolta justa.

No mesmo instante tive a impressão de já ter visto aquela cena em algum lugar e me lembrei das inúmeras fotos que vi de pescadores segurando com orgulho, pendurados, seus peixes como o prêmio merecido pela dedicação ao seu esporte. “Será que ninguém percebe que o coitadinho do peixe, além de tudo, não pode respirar fora da água?”, pensei, sem conseguir tirar os olhos da foto.

A maior parte dos peixes pescados morre sufocada – e se debatendo em desespero, lutando contra a dor e para respirar. Aos que ainda acreditam que peixe não sente dor e por isso com eles podemos fazer de tudo, existem diversos materiais disponíveis demonstrando o contrário. Só para citar um deles, um resultado de pesquisa publicado em 2003 por cientistas britânicos apontava a primeira evidência conclusiva da dor que os peixes sentem, tendo encontrado áreas na cabeça das trutas que responderam a estímulos destrutivos, além de reações a substâncias nocivas. O estudo foi feito por uma equipe do Instituto Roslin, em parceria com a Universidade de Edimburgo e publicado na revista científica Proceedings da Royal Society (academia britânica de ciência).

Meu questionamento diante do e-mail era: se os peixes sentem dor, morrem asfixiados, não seria justo enviar e-mail com fotos dos pescadores assim como estava sendo feito com aqueles rapazes para que fossem encontrados e também pagassem pela crueldade com inocentes animais?

Quero deixar claro que acho justa a revolta e indignação diante da atitude dos garotos. Acontece que não entendo não surgir a mesma revolta diante de cenas semelhantes, somente porque pescar foi inserido em nossa cultura como uma coisa bacana, legal, sem maiores conseqüências. O personagem principal é o mesmo, o pescador, seja de peixes ou cachorros.

Não é à toa que quando estamos em uma situação difícil, incômoda, dolorosa, em um lugar do qual queremos sair correndo para nunca mais voltar, dizemos: “sinto-me como um peixe fora d´água”. Não deve ser fácil morrer sufocado.

Sugiro a quem receber o tal e-mail com a foto experimentar fazer uma substituição mental colocando, no lugar do cachorro, a figura de um peixe. Se achamos que um não pode sofrer, mas o outro pode, talvez esteja na hora de revermos nossos valores…

“Enquanto via o peixe lutando para respirar, percebi que a vida dele é tão importante para ele quanto a minha vida é importante para mim” – Paul McCartney, que virou vegetariano depois de uma pescaria.

Cachorro Pendurado pelo Pescoço.


Cachorro Pendurado pelo Pescoço:  “PROCURAM-SE esses jovens que maltrataram um filhote e tiraram fotos” era a referência na linha de assunto do e-mail que eu recebi de amigos. O texto, pedindo que todos repassassem com urgência para que alguém reconhecesse os personagens da foto e os denunciassem, trazia palavras impublicáveis de xingamento aos dois rapazes que apareciam segurando um cachorro pendurado pelo pescoço por uma espécie de barbante, como se estivesse enforcado. Revolta justa.

No mesmo instante tive a impressão de já ter visto aquela cena em algum lugar e me lembrei das inúmeras fotos que vi de pescadores segurando com orgulho, pendurados, seus peixes como o prêmio merecido pela dedicação ao seu esporte. “Será que ninguém percebe que o coitadinho do peixe, além de tudo, não pode respirar fora da água?”, pensei, sem conseguir tirar os olhos da foto.

A maior parte dos peixes pescados morre sufocada – e se debatendo em desespero, lutando contra a dor e para respirar. Aos que ainda acreditam que peixe não sente dor e por isso com eles podemos fazer de tudo, existem diversos materiais disponíveis demonstrando o contrário. Só para citar um deles, um resultado de pesquisa publicado em 2003 por cientistas britânicos apontava a primeira evidência conclusiva da dor que os peixes sentem, tendo encontrado áreas na cabeça das trutas que responderam a estímulos destrutivos, além de reações a substâncias nocivas. O estudo foi feito por uma equipe do Instituto Roslin, em parceria com a Universidade de Edimburgo e publicado na revista científica Proceedings da Royal Society (academia britânica de ciência).

Meu questionamento diante do e-mail era: se os peixes sentem dor, morrem asfixiados, não seria justo enviar e-mail com fotos dos pescadores assim como estava sendo feito com aqueles rapazes para que fossem encontrados e também pagassem pela crueldade com inocentes animais?

Quero deixar claro que acho justa a revolta e indignação diante da atitude dos garotos. Acontece que não entendo não surgir a mesma revolta diante de cenas semelhantes, somente porque pescar foi inserido em nossa cultura como uma coisa bacana, legal, sem maiores conseqüências. O personagem principal é o mesmo, o pescador, seja de peixes ou cachorros.

Não é à toa que quando estamos em uma situação difícil, incômoda, dolorosa, em um lugar do qual queremos sair correndo para nunca mais voltar, dizemos: “sinto-me como um peixe fora d´água”. Não deve ser fácil morrer sufocado.

Sugiro a quem receber o tal e-mail com a foto experimentar fazer uma substituição mental colocando, no lugar do cachorro, a figura de um peixe. Se achamos que um não pode sofrer, mas o outro pode, talvez esteja na hora de revermos nossos valores…

“Enquanto via o peixe lutando para respirar, percebi que a vida dele é tão importante para ele quanto a minha vida é importante para mim” – Paul McCartney, que virou vegetariano depois de uma pescaria.


segunda-feira, maio 26, 2014

Operações sem Anestesia - Cachorros.



Operações sem Anestesia - Cachorros:  A importância que dou ao sofrimento de alguém não depende apenas de sua intensidade e das características físicas dos seres que o sentem. Nesse sentido, considero-me como anti-especista, e é por esta razão que proponho este texto aos Cahiers antispécistes. Estou, porém, em desacordo com as posições expressadas nos CA a respeito da ecologia, assim como com aquelas que associam o anti-especismo à ética.  Web site de Philippe Laporte: http://phi.lap.free.fr/

Em janeiro e fevereiro de 1995, algumas associações mobilizaram-se na Inglaterra e na França para sensibilizar a opinião pública a respeito do destino dos animais de corte durante o transporte e abate. Tal campanha aproveitou as circunstâncias para suscitar uma trabalhosa conscientização com relação ao sofrimento que a humanidade impõe às espécies que ela escraviza para o seu próprio conforto. Este tipo de campanha, desde o final do século XIX, estimula a lenta evolução de uma legislação que imponha, por exemplo, pouco a pouco, as técnicas relativamente indolores de morte.
Nesta ocasião, a difusão de reportagens televisivas revelou a um público surpreso e chocado a crueldade com que são tratados os animais de corte em todos os estágios de sua vida. A idéia passada para o público foi a de que assim que forem regulados os últimos detalhes legislativos, o problema desaparecerá.

Portanto, quem quiser aplicar os conhecimentos de psicologia social na relação entre humanos e animais explorados estará apto a prever que nenhuma legislação será suficiente para acabar com os maus-tratos, salvo se proibir pura e simplesmente toda a exploração.

O sadismo inerente às praticas de exploração de todo animal funda sua causa no fato do criador, do transportador e do açougueiro conhecerem o destino final dos animais criados para o abate: o açougue. Ainda em vida, o animal já é designado como carne. Os vivisseccionistas, por exemplo, têm o hábito de dizer que desde o instante em que utilizar um animal para transformá-lo em carne não choque ninguém, eles também podem ser utilizados para qualquer outra finalidade, ainda que mais cruel. Parece então que a primeira porta que leva ao sadismo é a do açougue.

A esperança das organizações que militam para melhorar o destino dos animais de corte corre o risco de se tornar utópica. Talvez estas organizações duvidem delas próprias, já que a única reforma «aceitável» da exploração seria… sua abolição. Mas talvez estas organizações também acreditem (enganadas ou com razão) que, por enquanto, só uma mensagem atenuada tenha chances de ser ouvida.

A experiência de Zimbardo

A mais notável experiência de psicologia social que tenha simulado uma relação de dominação institucional que possa ser comparável à do humano que educa, transporta e abate o animal, foi provavelmente a de Zimbardo. Em 1971 em Palo Alto, Califórnia, dentro do departamento de psicologia da universidade de Stanford, foi realizada uma experiência sob a direção de Philip Zimbardo para estudar as relações entre guardas e prisioneiros de instituições carcerárias. Dez falsos prisioneiros e onze guardas falsos foram selecionados, dentre setenta e cinco candidatos que responderam aos anúncios. Foram escolhidos os mais sólidos física e moralmente, os mais maduros e mais sociáveis. Participaram igualmente da experiência um supervisor, um diretor, um comitê de libertação sob juramento e um comitê de mediação. Inicialmente prevista para durar quatorze dias, a experiência foi interrompida depois de seis dias por causa do comportamento dos «guardas» que se tornaram sádicos. Mesmo os mais calmos e pacíficos, que se julgavam, talvez, incapazes de maltratar um ser humano, transformaram-se rapidamente em brutos irreconhecíveis. Uma descrição relativamente detalhada desta experiência pode ser encontrada no L’esprit nu.2. A obra expõe, igualmente, certos conhecimentos tirados desta experiência, (contando com aqueles que participaram, sobre o conhecimento de si mesmo) assim como algumas controvérsias que ela suscita. Sem entrar em detalhes, vou me salientar, sobretudo, que mesmo existindo alguns erros de interpretação dos comportamentos observados, esta experiência confirma que tais comportamentos foram induzidos pelo sistema penitenciário, e exclusivamente por este, e não por um sadismo intrínseco dos participantes. Além disso, este comportamento observado tem poucas variações em todas as instituições repreensivas. Que este ponto não cause agora mais dúvidas é certamente o argumento mais importante no debate sobre o sadismo existente no seio da exploração animal.

A explicação psicológica

Quanto à explicação psicológica do fenômeno, se ela não pode beneficiar-se das mesmas certezas e fontes de observação, ela não deixa de ser interessante.

A experiência de início coloca em evidência o prazer de dominar, mesmo naqueles em que menos se espera.

Mas existe, a meu ver, uma segunda razão confirmada por outras observações3 para o desenvolvimento do sadismo em todas as explorações ou dominações institucionalizadas. Imagine que durante a última guerra mundial você foi um oficial alemão obrigado a servir, contra sua vontade, em um campo de extermínio. Imagine que você não tenha tido a coragem de desertar, e que sua função social tenha sido a de matar judeus/judias, ciganos ou homossexuais. É evidentemente impossível assumir esta função social com indiferença. Como você se justificaria para si próprio? Sou um lixo? Para evitar isso, existe apenas uma saída psicológica: as vítimas são os safados. É a única justificativa possível no meu papel de carrasco. Quanto mais eu for sádico com eles, mais os considerarei como detestáveis e mais eu me justificarei aos meus próprios olhos. Um amigo dentista me contou ter sido levado durante seus estudos a operar mandíbulas de cadáveres. A reação de muitos estudantes foi de manifestar uma crueldade aparentemente gratuita com relação a esses corpos mortos, furando seus olhos, por exemplo. Isto não revelaria também o mesmo fenômeno? Se lhe pedem pra cortar o corpo de alguém que acaba de morrer e contra quem você não tem nenhuma animosidade, você poderia fazê-lo sem o mínimo incômodo? Não teria sido mais fácil se esse corpo fosse de um dejeto? Então já que você está em posição dominante, é o jogo que você vai jogar. Se você está sendo pago para matar cinco porcos por dia, ao invés de lhes colocar no chão sem lhes fazer mal ao retirá-los do caminhão, você vai deixá-los cair de dois metros de altura para que quebrem a coluna vertebral, e como se isso não bastasse, você ainda lhes dará um grande ponta-pé nas costelas.

Não teve opção: senão você se consideraria um monstro. Reprovamos freqüentemente os vivisseccionistas pela crueldade «gratuita» que demonstram. Sem contar os testes efetuados em animais e operações sem anestesia, eles/elas os manipulam sadicamente, deixando-os sofrer cruelmente sobre uma mesa de operação durante a hora do almoço, etc.

Não se encontra explicação para tal crueldade, geralmente subentende-se que todo o indivíduo normalmente constituído evitaria tais torturas inúteis e quem as realiza se transforma em monstro. Não se compreende que para eles/elas esta é a única fonte psicológica da crueldade que implica seu papel social e que cada um de nos será fortemente tentado (a) a adotar o mesmo num contexto similar.

Poderíamos concluir que, na escala da nossa sociedade, é utopia querer colocar um fim a este tipo de sadismo sem renunciar à exploração animal.


Utilizar um Animal para Transformá-lo em Carne - Cachorros.



Utilizar um Animal para Transformá-lo em Carne - Cachorros:  A importância que dou ao sofrimento de alguém não depende apenas de sua intensidade e das características físicas dos seres que o sentem. Nesse sentido, considero-me como anti-especista, e é por esta razão que proponho este texto aos Cahiers antispécistes. Estou, porém, em desacordo com as posições expressadas nos CA a respeito da ecologia, assim como com aquelas que associam o anti-especismo à ética.  Web site de Philippe Laporte: http://phi.lap.free.fr/

Em janeiro e fevereiro de 1995, algumas associações mobilizaram-se na Inglaterra e na França para sensibilizar a opinião pública a respeito do destino dos animais de corte durante o transporte e abate. Tal campanha aproveitou as circunstâncias para suscitar uma trabalhosa conscientização com relação ao sofrimento que a humanidade impõe às espécies que ela escraviza para o seu próprio conforto. Este tipo de campanha, desde o final do século XIX, estimula a lenta evolução de uma legislação que imponha, por exemplo, pouco a pouco, as técnicas relativamente indolores de morte.
Nesta ocasião, a difusão de reportagens televisivas revelou a um público surpreso e chocado a crueldade com que são tratados os animais de corte em todos os estágios de sua vida. A idéia passada para o público foi a de que assim que forem regulados os últimos detalhes legislativos, o problema desaparecerá.

Portanto, quem quiser aplicar os conhecimentos de psicologia social na relação entre humanos e animais explorados estará apto a prever que nenhuma legislação será suficiente para acabar com os maus-tratos, salvo se proibir pura e simplesmente toda a exploração.

O sadismo inerente às praticas de exploração de todo animal funda sua causa no fato do criador, do transportador e do açougueiro conhecerem o destino final dos animais criados para o abate: o açougue. Ainda em vida, o animal já é designado como carne. Os vivisseccionistas, por exemplo, têm o hábito de dizer que desde o instante em que utilizar um animal para transformá-lo em carne não choque ninguém, eles também podem ser utilizados para qualquer outra finalidade, ainda que mais cruel. Parece então que a primeira porta que leva ao sadismo é a do açougue.

A esperança das organizações que militam para melhorar o destino dos animais de corte corre o risco de se tornar utópica. Talvez estas organizações duvidem delas próprias, já que a única reforma «aceitável» da exploração seria… sua abolição. Mas talvez estas organizações também acreditem (enganadas ou com razão) que, por enquanto, só uma mensagem atenuada tenha chances de ser ouvida.

A experiência de Zimbardo

A mais notável experiência de psicologia social que tenha simulado uma relação de dominação institucional que possa ser comparável à do humano que educa, transporta e abate o animal, foi provavelmente a de Zimbardo. Em 1971 em Palo Alto, Califórnia, dentro do departamento de psicologia da universidade de Stanford, foi realizada uma experiência sob a direção de Philip Zimbardo para estudar as relações entre guardas e prisioneiros de instituições carcerárias. Dez falsos prisioneiros e onze guardas falsos foram selecionados, dentre setenta e cinco candidatos que responderam aos anúncios. Foram escolhidos os mais sólidos física e moralmente, os mais maduros e mais sociáveis. Participaram igualmente da experiência um supervisor, um diretor, um comitê de libertação sob juramento e um comitê de mediação. Inicialmente prevista para durar quatorze dias, a experiência foi interrompida depois de seis dias por causa do comportamento dos «guardas» que se tornaram sádicos. Mesmo os mais calmos e pacíficos, que se julgavam, talvez, incapazes de maltratar um ser humano, transformaram-se rapidamente em brutos irreconhecíveis. Uma descrição relativamente detalhada desta experiência pode ser encontrada no L’esprit nu.2. A obra expõe, igualmente, certos conhecimentos tirados desta experiência, (contando com aqueles que participaram, sobre o conhecimento de si mesmo) assim como algumas controvérsias que ela suscita. Sem entrar em detalhes, vou me salientar, sobretudo, que mesmo existindo alguns erros de interpretação dos comportamentos observados, esta experiência confirma que tais comportamentos foram induzidos pelo sistema penitenciário, e exclusivamente por este, e não por um sadismo intrínseco dos participantes. Além disso, este comportamento observado tem poucas variações em todas as instituições repreensivas. Que este ponto não cause agora mais dúvidas é certamente o argumento mais importante no debate sobre o sadismo existente no seio da exploração animal.

A explicação psicológica

Quanto à explicação psicológica do fenômeno, se ela não pode beneficiar-se das mesmas certezas e fontes de observação, ela não deixa de ser interessante.

A experiência de início coloca em evidência o prazer de dominar, mesmo naqueles em que menos se espera.

Mas existe, a meu ver, uma segunda razão confirmada por outras observações3 para o desenvolvimento do sadismo em todas as explorações ou dominações institucionalizadas. Imagine que durante a última guerra mundial você foi um oficial alemão obrigado a servir, contra sua vontade, em um campo de extermínio. Imagine que você não tenha tido a coragem de desertar, e que sua função social tenha sido a de matar judeus/judias, ciganos ou homossexuais. É evidentemente impossível assumir esta função social com indiferença. Como você se justificaria para si próprio? Sou um lixo? Para evitar isso, existe apenas uma saída psicológica: as vítimas são os safados. É a única justificativa possível no meu papel de carrasco. Quanto mais eu for sádico com eles, mais os considerarei como detestáveis e mais eu me justificarei aos meus próprios olhos. Um amigo dentista me contou ter sido levado durante seus estudos a operar mandíbulas de cadáveres. A reação de muitos estudantes foi de manifestar uma crueldade aparentemente gratuita com relação a esses corpos mortos, furando seus olhos, por exemplo. Isto não revelaria também o mesmo fenômeno? Se lhe pedem pra cortar o corpo de alguém que acaba de morrer e contra quem você não tem nenhuma animosidade, você poderia fazê-lo sem o mínimo incômodo? Não teria sido mais fácil se esse corpo fosse de um dejeto? Então já que você está em posição dominante, é o jogo que você vai jogar. Se você está sendo pago para matar cinco porcos por dia, ao invés de lhes colocar no chão sem lhes fazer mal ao retirá-los do caminhão, você vai deixá-los cair de dois metros de altura para que quebrem a coluna vertebral, e como se isso não bastasse, você ainda lhes dará um grande ponta-pé nas costelas.

Não teve opção: senão você se consideraria um monstro. Reprovamos freqüentemente os vivisseccionistas pela crueldade «gratuita» que demonstram. Sem contar os testes efetuados em animais e operações sem anestesia, eles/elas os manipulam sadicamente, deixando-os sofrer cruelmente sobre uma mesa de operação durante a hora do almoço, etc.

Não se encontra explicação para tal crueldade, geralmente subentende-se que todo o indivíduo normalmente constituído evitaria tais torturas inúteis e quem as realiza se transforma em monstro. Não se compreende que para eles/elas esta é a única fonte psicológica da crueldade que implica seu papel social e que cada um de nos será fortemente tentado (a) a adotar o mesmo num contexto similar.

Poderíamos concluir que, na escala da nossa sociedade, é utopia querer colocar um fim a este tipo de sadismo sem renunciar à exploração animal.


O Sadismo Inerente - Cachorros.


O Sadismo Inerente - Cachorros:  A importância que dou ao sofrimento de alguém não depende apenas de sua intensidade e das características físicas dos seres que o sentem. Nesse sentido, considero-me como anti-especista, e é por esta razão que proponho este texto aos Cahiers antispécistes. Estou, porém, em desacordo com as posições expressadas nos CA a respeito da ecologia, assim como com aquelas que associam o anti-especismo à ética.  Web site de Philippe Laporte: http://phi.lap.free.fr/

Em janeiro e fevereiro de 1995, algumas associações mobilizaram-se na Inglaterra e na França para sensibilizar a opinião pública a respeito do destino dos animais de corte durante o transporte e abate. Tal campanha aproveitou as circunstâncias para suscitar uma trabalhosa conscientização com relação ao sofrimento que a humanidade impõe às espécies que ela escraviza para o seu próprio conforto. Este tipo de campanha, desde o final do século XIX, estimula a lenta evolução de uma legislação que imponha, por exemplo, pouco a pouco, as técnicas relativamente indolores de morte.
Nesta ocasião, a difusão de reportagens televisivas revelou a um público surpreso e chocado a crueldade com que são tratados os animais de corte em todos os estágios de sua vida. A idéia passada para o público foi a de que assim que forem regulados os últimos detalhes legislativos, o problema desaparecerá.

Portanto, quem quiser aplicar os conhecimentos de psicologia social na relação entre humanos e animais explorados estará apto a prever que nenhuma legislação será suficiente para acabar com os maus-tratos, salvo se proibir pura e simplesmente toda a exploração.

O sadismo inerente às praticas de exploração de todo animal funda sua causa no fato do criador, do transportador e do açougueiro conhecerem o destino final dos animais criados para o abate: o açougue. Ainda em vida, o animal já é designado como carne. Os vivisseccionistas, por exemplo, têm o hábito de dizer que desde o instante em que utilizar um animal para transformá-lo em carne não choque ninguém, eles também podem ser utilizados para qualquer outra finalidade, ainda que mais cruel. Parece então que a primeira porta que leva ao sadismo é a do açougue.

A esperança das organizações que militam para melhorar o destino dos animais de corte corre o risco de se tornar utópica. Talvez estas organizações duvidem delas próprias, já que a única reforma «aceitável» da exploração seria… sua abolição. Mas talvez estas organizações também acreditem (enganadas ou com razão) que, por enquanto, só uma mensagem atenuada tenha chances de ser ouvida.

A experiência de Zimbardo

A mais notável experiência de psicologia social que tenha simulado uma relação de dominação institucional que possa ser comparável à do humano que educa, transporta e abate o animal, foi provavelmente a de Zimbardo. Em 1971 em Palo Alto, Califórnia, dentro do departamento de psicologia da universidade de Stanford, foi realizada uma experiência sob a direção de Philip Zimbardo para estudar as relações entre guardas e prisioneiros de instituições carcerárias. Dez falsos prisioneiros e onze guardas falsos foram selecionados, dentre setenta e cinco candidatos que responderam aos anúncios. Foram escolhidos os mais sólidos física e moralmente, os mais maduros e mais sociáveis. Participaram igualmente da experiência um supervisor, um diretor, um comitê de libertação sob juramento e um comitê de mediação. Inicialmente prevista para durar quatorze dias, a experiência foi interrompida depois de seis dias por causa do comportamento dos «guardas» que se tornaram sádicos. Mesmo os mais calmos e pacíficos, que se julgavam, talvez, incapazes de maltratar um ser humano, transformaram-se rapidamente em brutos irreconhecíveis. Uma descrição relativamente detalhada desta experiência pode ser encontrada no L’esprit nu.2. A obra expõe, igualmente, certos conhecimentos tirados desta experiência, (contando com aqueles que participaram, sobre o conhecimento de si mesmo) assim como algumas controvérsias que ela suscita. Sem entrar em detalhes, vou me salientar, sobretudo, que mesmo existindo alguns erros de interpretação dos comportamentos observados, esta experiência confirma que tais comportamentos foram induzidos pelo sistema penitenciário, e exclusivamente por este, e não por um sadismo intrínseco dos participantes. Além disso, este comportamento observado tem poucas variações em todas as instituições repreensivas. Que este ponto não cause agora mais dúvidas é certamente o argumento mais importante no debate sobre o sadismo existente no seio da exploração animal.

A explicação psicológica

Quanto à explicação psicológica do fenômeno, se ela não pode beneficiar-se das mesmas certezas e fontes de observação, ela não deixa de ser interessante.

A experiência de início coloca em evidência o prazer de dominar, mesmo naqueles em que menos se espera.

Mas existe, a meu ver, uma segunda razão confirmada por outras observações3 para o desenvolvimento do sadismo em todas as explorações ou dominações institucionalizadas. Imagine que durante a última guerra mundial você foi um oficial alemão obrigado a servir, contra sua vontade, em um campo de extermínio. Imagine que você não tenha tido a coragem de desertar, e que sua função social tenha sido a de matar judeus/judias, ciganos ou homossexuais. É evidentemente impossível assumir esta função social com indiferença. Como você se justificaria para si próprio? Sou um lixo? Para evitar isso, existe apenas uma saída psicológica: as vítimas são os safados. É a única justificativa possível no meu papel de carrasco. Quanto mais eu for sádico com eles, mais os considerarei como detestáveis e mais eu me justificarei aos meus próprios olhos. Um amigo dentista me contou ter sido levado durante seus estudos a operar mandíbulas de cadáveres. A reação de muitos estudantes foi de manifestar uma crueldade aparentemente gratuita com relação a esses corpos mortos, furando seus olhos, por exemplo. Isto não revelaria também o mesmo fenômeno? Se lhe pedem pra cortar o corpo de alguém que acaba de morrer e contra quem você não tem nenhuma animosidade, você poderia fazê-lo sem o mínimo incômodo? Não teria sido mais fácil se esse corpo fosse de um dejeto? Então já que você está em posição dominante, é o jogo que você vai jogar. Se você está sendo pago para matar cinco porcos por dia, ao invés de lhes colocar no chão sem lhes fazer mal ao retirá-los do caminhão, você vai deixá-los cair de dois metros de altura para que quebrem a coluna vertebral, e como se isso não bastasse, você ainda lhes dará um grande ponta-pé nas costelas.

Não teve opção: senão você se consideraria um monstro. Reprovamos freqüentemente os vivisseccionistas pela crueldade «gratuita» que demonstram. Sem contar os testes efetuados em animais e operações sem anestesia, eles/elas os manipulam sadicamente, deixando-os sofrer cruelmente sobre uma mesa de operação durante a hora do almoço, etc.

Não se encontra explicação para tal crueldade, geralmente subentende-se que todo o indivíduo normalmente constituído evitaria tais torturas inúteis e quem as realiza se transforma em monstro. Não se compreende que para eles/elas esta é a única fonte psicológica da crueldade que implica seu papel social e que cada um de nos será fortemente tentado (a) a adotar o mesmo num contexto similar.

Poderíamos concluir que, na escala da nossa sociedade, é utopia querer colocar um fim a este tipo de sadismo sem renunciar à exploração animal.


domingo, maio 25, 2014

Vara a Cabeça do Animal - Cachorros.


Vara a Cabeça do Animal - Cachorros:  “Não há fuga conveniente da culpa associada ao que  ocorre dentro de um matadouro, como no caso dos bebês focas no Ártico. Enquanto é fácil para a maioria de nós evitar comprar objetos para os quais as focas foram mortas — assim incorrendo na culpa pelas suas mortes — a maioria das pessoas voluntariamente (e impensadamente) come a carne de um tipo de animal ou outro cuja vida foi encerrada entre as paredes de um matadouro.”
Quando sugeriram que eu visitasse um matadouro para que observasse em primeira mão as infrações aos direitos dos animais, fui muito cético. A razão de meu ceticismo foi que eu pensava que um matadouro não apresentava um exemplo de crueldade distante o suficiente de nossa vida diária para ser pungente ou relevante em uma discussão sobre direitos dos animais. Sentia que deveria escrever  algo um pouco mais exótico ou considerado cruel ou imoral, como a matança de bebês focas. Estava terrivelmente enganado. O fato do que acontece em  um matadouro ser causado pela demanda que a vasta maioria da população exige da carne de outros seres vivos torna tudo ainda mais pungente e  relevante.

Quando saía de meu carro no estacionamento de uma fábrica de empacotamento, a combinação de sons e odores que vinham da construção metálica me fez  questionar se aquilo era algo que eu realmente  queria conhecer. A primeira coisa que me despertou os sentidos foi o barulho do gado — não o mugido bucólico e agradável que se pode ouvir em uma estrada rural próxima a uma fazenda, mas um mugido rápido e frenético. Era uma espécie de mugido que ouvi certa vez durante um fim de semana na fazenda leiteira de meu tio, quando uma das vacas foi atacada por cães vadios. Fora o barulho, a liberação de adrenalina no seu corpo fazia que a vaca respirasse tão rapidamente que chegava a ter dificuldade.

Naquele momento no estacionamento, podia sentir o desconforto no som das vacas, mas depois descobri que cada uma que aguardava no corredor que levava ao “estábulo da matança” estava sofrendo dos mesmos sintomas de terror que testemunhei na fazenda de meu tio.

A segunda coisa que notei também foi outro som. Enquanto andava na direção do prédio, ouvia um chiado estranho que somente poderia ser de uma serra cortando ossos ainda envoltos em carne. Neste ponto descobri que não estava preparado para o que iria experimentar. Este sentimento foi se intensificando ao ponto de náuseas quando, enquanto me aproximava, senti pela primeira vez a combinação de odores que permaneceria durante as próximas horas: o cheiro enjoado e nojento de carne recém-abatida ainda quente da vida tão recentemente removida; o cheiro não enjoado, mas nauseante da fervura de lingüiças e salsichas e o frio ranger da carne sendo pendurada, carcaça após carcaça, fileira após fileira, na área de refrigeração. Minha imaginação havia me preparado para a experiência visual, mas eu estava completamente despreparado para o cheiro quase insuportável que permeava inteiramente a fábrica.

Depois de breves “amabilidades” com Jerry, o gerente de produção da fábrica, foi-me permitido prosseguir pela fábrica sem guias e no meu próprio passo.  Comecei a visita “onde tudo começa”, como Jerry colocou, na “área de matança”.
Entrei na área de matança através de um corredor curto, parecido com um túnel, através do qual eu podia ver o que logo saberia ser a terceira estação de açougue.

A área de matança consistia de uma sala na qual um número de operações era executada por um ou dois entre seis açougueiros em quatro estações ao longo da extensão da sala. Na área de matança havia também um inspetor do departamento de agricultura americano (USDA) que examinava as partes de cada animal que passava.

A primeira estação é a estação de abate. Nela trabalha um único homem cujo trabalho é guiar o animal até o estábulo de abate, matá-lo e começar o processo de açougue. Este estágio do processo leva cerca de dez minutos para cada animal e começa com a abertura de uma pesada porta de aço que separa o estábulo de abate da área de espera.

O homem que trabalha nesta estação deve entrar em um corredor adjacente ao pátio de espera e conduzir sua próxima vítima na área de matança com uma vara elétrica de alta-tensão. Esta é parte que demora mais tempo da operação pois o gado tem  plena consciência do que os espera à frente e está determinado a não entrar na área de matança. Os sintomas físicos de terror são dolorosamente  evidentes nas faces de cada animal que vi, tanto na área de matança quanto na área de espera.

Durante cerca de 40 segundos a um minuto que cada animal fica esperando na área de matança antes de perder a consciência, o terror se torna visivelmente mais intenso. O animal podia cheirar o sangue e ver seus companheiros em vários estágios de desmembramento. Durante os poucos últimos segundos de vida, o animal desaba na área restrita do estábulo. Todas as quatro vacas cuja morte eu presenciei pulavam freneticamente, futilmente e pateticamente para o alto — a única direção que não estava bloqueada por uma porta de aço. A morte vem sob a forma de uma vara pneumática que é colocada contra a cabeça e disparada.
A pistola é projetada de modo que a haste jamais sai completamente, ela simplesmente vara a cabeça do animal e depois é puxada pelo açougueiro enquanto o animal desmaia. Vi isso sendo usado três ou quatro vezes, fazia o seu trabalho de primeira, mas uma vaca se debateu bastante até desmaiar. Depois que o animal desmaia, a lateral  do estábulo de abate é levantada e uma corrente é colocada na pata direita. A vaca é então içada por  essa perna e fica pendurada.

Neste ponto, o açougueiro drena o sangue do corpo fazendo um corte no pescoço da vaca. Quando as artérias são cortadas há uma corrente impressionante de sangue de modo que o açougueiro não consegue se afastar rapidamente e não consegue evitar levar um banho. Esta corrente de sangue quente dura cerca de 15 segundos, após a qual a única tarefa deixada pelo homem na primeira estação é esfolar o couro e remover a cabeça do animal.

Na segunda estação na área de matança, o animal sem cabeça é jogado no chão. O corpo é cortado na traseira, estripado e, se for fêmea, o saco de leite e as tetas são removidas. Neste momento, toda a urina e as fezes que não foram drenadas do corpo durante os primeiros segundos de morte correm soltos pelo chão. O corpo é então cortado até o meio e a pele afastada parcialmente. Uma corda é amarrada nas pernas traseiras, o corpo é levantado e o resto é puxado através de roldanas presas no chão, removendo a pele por inteira. O corpo do animal entra então na terceira estação da área de matança para ser retalhado e cortado na metade – tornando-se duas “metades de bife”.

As metades de bife são lavadas e pesadas na quarta e última estação de matança.  Elas são colocadas então num armário de refrigeração onde o calor restante da vida  lentamente se esvai antes de prosseguir para o freezer de super congelamento. Do armário de refrigeração, a carne prossegue para a área de armazenamento principal onde fica por até uma semana. Este armário tem uma saída para a área de açougue onde as laterais de carne são reduzidas em partes para serem enviadas aos supermercados e, posteriormente, chegarem até as mesas de refeição.

A parada final em meu ‘tour’ foi a fábrica de salsichas e lingüiças. Sempre dizem que se alguém pudesse ver o que tem dentro de uma salsicha jamais comeria uma novamente. Bem, esse ditado se aplica dez vezes mais à produção de lingüiça. O cheiro mais violentamente nauseante que jamais senti foi o que vinha dos tanques de fervura da carne para lingüiça.

Quando saía do complexo, estava envergonhado quanto ao meu ceticismo anterior e encorajo a qualquer um que tenha dúvidas como as que eu tinha, que faça uma visita a um matadouro ou passe um dia em uma fazenda fábrica. Creio que tenha ficado claro que deve existir uma forma melhor de nos alimentarmos e que é nossa missão, como seres capazes moralmente, perseguir formas alternativas.

"Estabulo da Matança" - Cachorros.


"Estabulo da Matança" - Cachorros:   “Não há fuga conveniente da culpa associada ao que  ocorre dentro de um matadouro, como no caso dos bebês focas no Ártico. Enquanto é fácil para a maioria de nós evitar comprar objetos para os quais as focas foram mortas — assim incorrendo na culpa pelas suas mortes — a maioria das pessoas voluntariamente (e impensadamente) come a carne de um tipo de animal ou outro cuja vida foi encerrada entre as paredes de um matadouro.”
Quando sugeriram que eu visitasse um matadouro para que observasse em primeira mão as infrações aos direitos dos animais, fui muito cético. A razão de meu ceticismo foi que eu pensava que um matadouro não apresentava um exemplo de crueldade distante o suficiente de nossa vida diária para ser pungente ou relevante em uma discussão sobre direitos dos animais. Sentia que deveria escrever  algo um pouco mais exótico ou considerado cruel ou imoral, como a matança de bebês focas. Estava terrivelmente enganado. O fato do que acontece em  um matadouro ser causado pela demanda que a vasta maioria da população exige da carne de outros seres vivos torna tudo ainda mais pungente e  relevante.

Quando saía de meu carro no estacionamento de uma fábrica de empacotamento, a combinação de sons e odores que vinham da construção metálica me fez  questionar se aquilo era algo que eu realmente  queria conhecer. A primeira coisa que me despertou os sentidos foi o barulho do gado — não o mugido bucólico e agradável que se pode ouvir em uma estrada rural próxima a uma fazenda, mas um mugido rápido e frenético. Era uma espécie de mugido que ouvi certa vez durante um fim de semana na fazenda leiteira de meu tio, quando uma das vacas foi atacada por cães vadios. Fora o barulho, a liberação de adrenalina no seu corpo fazia que a vaca respirasse tão rapidamente que chegava a ter dificuldade.

Naquele momento no estacionamento, podia sentir o desconforto no som das vacas, mas depois descobri que cada uma que aguardava no corredor que levava ao “estábulo da matança” estava sofrendo dos mesmos sintomas de terror que testemunhei na fazenda de meu tio.

A segunda coisa que notei também foi outro som. Enquanto andava na direção do prédio, ouvia um chiado estranho que somente poderia ser de uma serra cortando ossos ainda envoltos em carne. Neste ponto descobri que não estava preparado para o que iria experimentar. Este sentimento foi se intensificando ao ponto de náuseas quando, enquanto me aproximava, senti pela primeira vez a combinação de odores que permaneceria durante as próximas horas: o cheiro enjoado e nojento de carne recém-abatida ainda quente da vida tão recentemente removida; o cheiro não enjoado, mas nauseante da fervura de lingüiças e salsichas e o frio ranger da carne sendo pendurada, carcaça após carcaça, fileira após fileira, na área de refrigeração. Minha imaginação havia me preparado para a experiência visual, mas eu estava completamente despreparado para o cheiro quase insuportável que permeava inteiramente a fábrica.

Depois de breves “amabilidades” com Jerry, o gerente de produção da fábrica, foi-me permitido prosseguir pela fábrica sem guias e no meu próprio passo.  Comecei a visita “onde tudo começa”, como Jerry colocou, na “área de matança”.
Entrei na área de matança através de um corredor curto, parecido com um túnel, através do qual eu podia ver o que logo saberia ser a terceira estação de açougue.

A área de matança consistia de uma sala na qual um número de operações era executada por um ou dois entre seis açougueiros em quatro estações ao longo da extensão da sala. Na área de matança havia também um inspetor do departamento de agricultura americano (USDA) que examinava as partes de cada animal que passava.

A primeira estação é a estação de abate. Nela trabalha um único homem cujo trabalho é guiar o animal até o estábulo de abate, matá-lo e começar o processo de açougue. Este estágio do processo leva cerca de dez minutos para cada animal e começa com a abertura de uma pesada porta de aço que separa o estábulo de abate da área de espera.

O homem que trabalha nesta estação deve entrar em um corredor adjacente ao pátio de espera e conduzir sua próxima vítima na área de matança com uma vara elétrica de alta-tensão. Esta é parte que demora mais tempo da operação pois o gado tem  plena consciência do que os espera à frente e está determinado a não entrar na área de matança. Os sintomas físicos de terror são dolorosamente  evidentes nas faces de cada animal que vi, tanto na área de matança quanto na área de espera.

Durante cerca de 40 segundos a um minuto que cada animal fica esperando na área de matança antes de perder a consciência, o terror se torna visivelmente mais intenso. O animal podia cheirar o sangue e ver seus companheiros em vários estágios de desmembramento. Durante os poucos últimos segundos de vida, o animal desaba na área restrita do estábulo. Todas as quatro vacas cuja morte eu presenciei pulavam freneticamente, futilmente e pateticamente para o alto — a única direção que não estava bloqueada por uma porta de aço. A morte vem sob a forma de uma vara pneumática que é colocada contra a cabeça e disparada.
A pistola é projetada de modo que a haste jamais sai completamente, ela simplesmente vara a cabeça do animal e depois é puxada pelo açougueiro enquanto o animal desmaia. Vi isso sendo usado três ou quatro vezes, fazia o seu trabalho de primeira, mas uma vaca se debateu bastante até desmaiar. Depois que o animal desmaia, a lateral  do estábulo de abate é levantada e uma corrente é colocada na pata direita. A vaca é então içada por  essa perna e fica pendurada.

Neste ponto, o açougueiro drena o sangue do corpo fazendo um corte no pescoço da vaca. Quando as artérias são cortadas há uma corrente impressionante de sangue de modo que o açougueiro não consegue se afastar rapidamente e não consegue evitar levar um banho. Esta corrente de sangue quente dura cerca de 15 segundos, após a qual a única tarefa deixada pelo homem na primeira estação é esfolar o couro e remover a cabeça do animal.

Na segunda estação na área de matança, o animal sem cabeça é jogado no chão. O corpo é cortado na traseira, estripado e, se for fêmea, o saco de leite e as tetas são removidas. Neste momento, toda a urina e as fezes que não foram drenadas do corpo durante os primeiros segundos de morte correm soltos pelo chão. O corpo é então cortado até o meio e a pele afastada parcialmente. Uma corda é amarrada nas pernas traseiras, o corpo é levantado e o resto é puxado através de roldanas presas no chão, removendo a pele por inteira. O corpo do animal entra então na terceira estação da área de matança para ser retalhado e cortado na metade – tornando-se duas “metades de bife”.

As metades de bife são lavadas e pesadas na quarta e última estação de matança.  Elas são colocadas então num armário de refrigeração onde o calor restante da vida  lentamente se esvai antes de prosseguir para o freezer de super congelamento. Do armário de refrigeração, a carne prossegue para a área de armazenamento principal onde fica por até uma semana. Este armário tem uma saída para a área de açougue onde as laterais de carne são reduzidas em partes para serem enviadas aos supermercados e, posteriormente, chegarem até as mesas de refeição.

A parada final em meu ‘tour’ foi a fábrica de salsichas e lingüiças. Sempre dizem que se alguém pudesse ver o que tem dentro de uma salsicha jamais comeria uma novamente. Bem, esse ditado se aplica dez vezes mais à produção de lingüiça. O cheiro mais violentamente nauseante que jamais senti foi o que vinha dos tanques de fervura da carne para lingüiça.

Quando saía do complexo, estava envergonhado quanto ao meu ceticismo anterior e encorajo a qualquer um que tenha dúvidas como as que eu tinha, que faça uma visita a um matadouro ou passe um dia em uma fazenda fábrica. Creio que tenha ficado claro que deve existir uma forma melhor de nos alimentarmos e que é nossa missão, como seres capazes moralmente, perseguir formas alternativas.

O Animal pode Cheirar o Sangue - Cachorros.


O Animal pode Cheirar o Sangue - Cachorros:  “Não há fuga conveniente da culpa associada ao que  ocorre dentro de um matadouro, como no caso dos bebês focas no Ártico. Enquanto é fácil para a maioria de nós evitar comprar objetos para os quais as focas foram mortas — assim incorrendo na culpa pelas suas mortes — a maioria das pessoas voluntariamente (e impensadamente) come a carne de um tipo de animal ou outro cuja vida foi encerrada entre as paredes de um matadouro.”
Quando sugeriram que eu visitasse um matadouro para que observasse em primeira mão as infrações aos direitos dos animais, fui muito cético. A razão de meu ceticismo foi que eu pensava que um matadouro não apresentava um exemplo de crueldade distante o suficiente de nossa vida diária para ser pungente ou relevante em uma discussão sobre direitos dos animais. Sentia que deveria escrever  algo um pouco mais exótico ou considerado cruel ou imoral, como a matança de bebês focas. Estava terrivelmente enganado. O fato do que acontece em  um matadouro ser causado pela demanda que a vasta maioria da população exige da carne de outros seres vivos torna tudo ainda mais pungente e  relevante.

Quando saía de meu carro no estacionamento de uma fábrica de empacotamento, a combinação de sons e odores que vinham da construção metálica me fez  questionar se aquilo era algo que eu realmente  queria conhecer. A primeira coisa que me despertou os sentidos foi o barulho do gado — não o mugido bucólico e agradável que se pode ouvir em uma estrada rural próxima a uma fazenda, mas um mugido rápido e frenético. Era uma espécie de mugido que ouvi certa vez durante um fim de semana na fazenda leiteira de meu tio, quando uma das vacas foi atacada por cães vadios. Fora o barulho, a liberação de adrenalina no seu corpo fazia que a vaca respirasse tão rapidamente que chegava a ter dificuldade.

Naquele momento no estacionamento, podia sentir o desconforto no som das vacas, mas depois descobri que cada uma que aguardava no corredor que levava ao “estábulo da matança” estava sofrendo dos mesmos sintomas de terror que testemunhei na fazenda de meu tio.

A segunda coisa que notei também foi outro som. Enquanto andava na direção do prédio, ouvia um chiado estranho que somente poderia ser de uma serra cortando ossos ainda envoltos em carne. Neste ponto descobri que não estava preparado para o que iria experimentar. Este sentimento foi se intensificando ao ponto de náuseas quando, enquanto me aproximava, senti pela primeira vez a combinação de odores que permaneceria durante as próximas horas: o cheiro enjoado e nojento de carne recém-abatida ainda quente da vida tão recentemente removida; o cheiro não enjoado, mas nauseante da fervura de lingüiças e salsichas e o frio ranger da carne sendo pendurada, carcaça após carcaça, fileira após fileira, na área de refrigeração. Minha imaginação havia me preparado para a experiência visual, mas eu estava completamente despreparado para o cheiro quase insuportável que permeava inteiramente a fábrica.

Depois de breves “amabilidades” com Jerry, o gerente de produção da fábrica, foi-me permitido prosseguir pela fábrica sem guias e no meu próprio passo.  Comecei a visita “onde tudo começa”, como Jerry colocou, na “área de matança”.
Entrei na área de matança através de um corredor curto, parecido com um túnel, através do qual eu podia ver o que logo saberia ser a terceira estação de açougue.

A área de matança consistia de uma sala na qual um número de operações era executada por um ou dois entre seis açougueiros em quatro estações ao longo da extensão da sala. Na área de matança havia também um inspetor do departamento de agricultura americano (USDA) que examinava as partes de cada animal que passava.

A primeira estação é a estação de abate. Nela trabalha um único homem cujo trabalho é guiar o animal até o estábulo de abate, matá-lo e começar o processo de açougue. Este estágio do processo leva cerca de dez minutos para cada animal e começa com a abertura de uma pesada porta de aço que separa o estábulo de abate da área de espera.

O homem que trabalha nesta estação deve entrar em um corredor adjacente ao pátio de espera e conduzir sua próxima vítima na área de matança com uma vara elétrica de alta-tensão. Esta é parte que demora mais tempo da operação pois o gado tem  plena consciência do que os espera à frente e está determinado a não entrar na área de matança. Os sintomas físicos de terror são dolorosamente  evidentes nas faces de cada animal que vi, tanto na área de matança quanto na área de espera.

Durante cerca de 40 segundos a um minuto que cada animal fica esperando na área de matança antes de perder a consciência, o terror se torna visivelmente mais intenso. O animal podia cheirar o sangue e ver seus companheiros em vários estágios de desmembramento. Durante os poucos últimos segundos de vida, o animal desaba na área restrita do estábulo. Todas as quatro vacas cuja morte eu presenciei pulavam freneticamente, futilmente e pateticamente para o alto — a única direção que não estava bloqueada por uma porta de aço. A morte vem sob a forma de uma vara pneumática que é colocada contra a cabeça e disparada.
A pistola é projetada de modo que a haste jamais sai completamente, ela simplesmente vara a cabeça do animal e depois é puxada pelo açougueiro enquanto o animal desmaia. Vi isso sendo usado três ou quatro vezes, fazia o seu trabalho de primeira, mas uma vaca se debateu bastante até desmaiar. Depois que o animal desmaia, a lateral  do estábulo de abate é levantada e uma corrente é colocada na pata direita. A vaca é então içada por  essa perna e fica pendurada.

Neste ponto, o açougueiro drena o sangue do corpo fazendo um corte no pescoço da vaca. Quando as artérias são cortadas há uma corrente impressionante de sangue de modo que o açougueiro não consegue se afastar rapidamente e não consegue evitar levar um banho. Esta corrente de sangue quente dura cerca de 15 segundos, após a qual a única tarefa deixada pelo homem na primeira estação é esfolar o couro e remover a cabeça do animal.

Na segunda estação na área de matança, o animal sem cabeça é jogado no chão. O corpo é cortado na traseira, estripado e, se for fêmea, o saco de leite e as tetas são removidas. Neste momento, toda a urina e as fezes que não foram drenadas do corpo durante os primeiros segundos de morte correm soltos pelo chão. O corpo é então cortado até o meio e a pele afastada parcialmente. Uma corda é amarrada nas pernas traseiras, o corpo é levantado e o resto é puxado através de roldanas presas no chão, removendo a pele por inteira. O corpo do animal entra então na terceira estação da área de matança para ser retalhado e cortado na metade – tornando-se duas “metades de bife”.

As metades de bife são lavadas e pesadas na quarta e última estação de matança.  Elas são colocadas então num armário de refrigeração onde o calor restante da vida  lentamente se esvai antes de prosseguir para o freezer de super congelamento. Do armário de refrigeração, a carne prossegue para a área de armazenamento principal onde fica por até uma semana. Este armário tem uma saída para a área de açougue onde as laterais de carne são reduzidas em partes para serem enviadas aos supermercados e, posteriormente, chegarem até as mesas de refeição.

A parada final em meu ‘tour’ foi a fábrica de salsichas e lingüiças. Sempre dizem que se alguém pudesse ver o que tem dentro de uma salsicha jamais comeria uma novamente. Bem, esse ditado se aplica dez vezes mais à produção de lingüiça. O cheiro mais violentamente nauseante que jamais senti foi o que vinha dos tanques de fervura da carne para lingüiça.

Quando saía do complexo, estava envergonhado quanto ao meu ceticismo anterior e encorajo a qualquer um que tenha dúvidas como as que eu tinha, que faça uma visita a um matadouro ou passe um dia em uma fazenda fábrica. Creio que tenha ficado claro que deve existir uma forma melhor de nos alimentarmos e que é nossa missão, como seres capazes moralmente, perseguir formas alternativas.

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